domingo, 30 de dezembro de 2018

É hora da matrícula, e agora?

Chegou aquela época do ano em que muitos pais se deparam com uma situação alarmante: onde matricular meu filho (a) autista. Para a maioria esse é um tema desesperador, de tirar o sono, já que o que mais desejamos é ver nossos filhos bem adaptados, recebendo ensinamentos, socializando e tendo o devido respeito.

O problema, para quem tem filhos com alguma necessidade, (não precisa ser somente a do Autismo), é que a tal "inclusão" só existe nas planilhas. Na prática esse cenário é sombrio e desolador. Vou explicar aqui o porquê.

Calma, não é necessário entrar em pânico uma vez que juntos somos mais fortes e temos todos os instrumentos para modificar esse cenário!

Meu filho, hoje com 12 anos, passou por diversas escolas (cerca de 6) e posso afirmar aqui que ele foi muito bem recebido por praticamente todas. Mas alguns fatos desagradáveis nos acompanharam nessa jornada. Por questões éticas não mencionarei os nomes das escolas.

A primeira escolinha era da Educação Infantil aos Primeiros Anos do Ensino Fundamental. Era uma gracinha, super organizada e com educadoras prestativas, funcionários educados e um clima bem familiar. Só que nessa faixa etária, (2 anos de idade), meu filho apresentava sinais muito leves de autismo, que foram ignorados pelos profissionais de Educação que o acompanhavam.

A segunda escola, também de Educação Infantil e anos iniciais do Fundamental, apresentou um olhar mais atento. Meu filho estava então com 3 para 4 anos e eles tentaram intermediar esse processo da descoberta do diagnóstico. O problema nesse momento foi que nós, os próprios pais, negamos a existência que qualquer "problema" e fizemos vista grossa por mais alguns meses, até que, finalmente em 2011, aos quase 5 anos de idade e com profissionais capacitados, conseguimos unir forças entre família, escola, neuropediatra e psicopedagoga para montarmos o programa terapêutico ideal para nosso filho. A partir daí foi só evolução. Na linguagem, na escrita, no desenvolvimento psicomotor, na interação social, na alimentação, entre outras esferas.

Alguns anos depois, já aos 8 anos, ele precisou trocar de escola. A instituição nos recebeu muito bem, de braços abertos, mas era uma instituição que passava por dificuldades financeiras e precisava aumenta a captação de alunos novos. Resultado: regressão total. Meu filho não aprendeu quase nada, socializou menos ainda e ficou agressivo, pois as pessoas não o compreendiam. Os cadernos vinham com operações matemáticas convencionais sem estarem resolvidas, textos quilométricos sem interpretação e outras tantas coisas sem sentido, abordadas de maneira aleatória. Ele ficava nervoso diariamente e gritava muito. Chegou a quase derrubar uma TV de 50 polegadas. Foi aí que a escola teve a "brilhante" ideia de que ele frequentasse as aulas somente 2x por semana. Eu, como especialista na área, aceitei passivamente por entender que a escola não tinha a menor condição de receber meu filho e os filhos de tantas outras mães e tudo que eu mais queria era que aquele ano terminasse para que eu o tirasse de lá e não recomendasse a escola nem para autistas nem para qualquer outra criança.

Bom, ha 3 anos meu filho está em uma escola onde se adaptou muito bem.Entretanto, deixa a desejar em alguns quesitos. Como sou o que chamamos de 'professora de área' (Língua Inglesa) sei como é a transição do Fundamental I para o Fundamental II no que diz respeito ao número exacerbado de disciplinas, conteúdos, livros, trabalhos, etc. Meu filho e outras tantas crianças não acompanham a rotina escolar dessa maneira. Eles precisam estar ao ar livre, experimentar coisas palpáveis em laboratório e ter alguém que explique numa velocidade reduzida para que possa haver compreensão e principalmente paciência e amor. A transição para o Fundamental II não foi positiva, uma vez que meu filho apresentou diversos episódios de agressividade, descontrole e até por que não dizer regressão cognitiva. 

E quando as instituições colocam a culpa na medicação? Ahhh sim, isso existe. Já ouvi demais essa pergunta: "Mãezinha, ele tomou a medicação hoje?"

Vale deixar registrado também que além de mãe ocupo o outro lado da situação. Durante minha trajetória profissional com docente em instituições de ensino presenciei até Coordenadoras Pedagógicas desdenhando de laudos médicos. Ora, se a pessoa que "encabeça" a lista de Educadores e de pessoas com qualificação adequada, que pode e deveria prestar um suporte profissional, se essa pessoa age de tal forma, como você espera que os demais funcionários atuem? Como você espera que estagiários de Pedagogia, por exemplo, que estão "treinando" na escola aprendam a tratar um portador de necessidades especiais? Como você espera que crianças com Transtornos Globais de Desenvolvimento possam ser inserido no mundo dos esportes, nas artes ou até mesmo no bilinguismo? Por acaso esses profissionais que deveriam encorajar a equipe e mostrar o jeito humano de se trabalhar pensam que estão fazendo algum tipo de favor à comunidade autista?

Deixo aqui uma outra pergunta: quando vocês vão visitar escolas regulares para seus filhos, o que mais se ouve do funcionário da secretaria? 

"Não, mãezinha, não temos mais vagas para alunos especiais, infelizmente."

Ué, mas e a lei brasileira de Inclusão? 
(Art. 1o É instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania. Parágrafo único.)

E no que diz respeito a  Lei nº 12.764, que institui a "Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista" sancionada em dezembro de 2012?

Falando especificamente de Educação, a lei é vista por especialistas como mais um reforço na luta pela inclusão. O texto estabelece que o autista tem direito de estudar em escolas regulares, tanto na Educação Básica quanto no Ensino Profissionalizante, e, se preciso, pode solicitar um acompanhante especializado. Ficam definidas, também, sanções aos gestores que negarem a matrícula a estudantes com deficiência. A punição será de três a 20 salários mínimos e, em caso de reincidência, levará à perda do cargo. "Recusar a matrícula já é algo proibido por lei, a medida reforça isso e estabelece a punição", comenta Mara Gabrilli (PSDB - SP)

Por isso mencionei anteriormente que juntos podemos fazer a diferença. Se permitirmos que a escola seja protagonista desse descaso precisamos divulgar. Não podemos ser coadjuvantes de um problema gritante como esse. As escolas devem se adequar aos problemas de saúde pública e não ao contrário. Já estamos virando 2019 e ainda vemos situações humilhantes com nossos filhos. Isso sem contar no alto preço das mensalidades, uniformes e livros.

Exija, faça valer o direito de sua criança, não se deixe enganar por um discurso pronto e principalmente verifique de perto se a escola está "incluindo" ou "ganhando mais uma matrícula" em cima do seu filho e do seu bolso. Não se intimide e se for necessário peça auxílio jurídico, pois no Brasil, só quando se mexe na conta bancária do outro é que se vê algum resultado benéfico.

Como Psicopedagoga clínica e como mãe, o que mais faço é escutar os lamentos de pais que estão desesperados com o futuro escolar incerto de seus filhos.

Desejo que 2019 seja diferente para nossos anjos azuis, com mais respeito e mais dignidade.

Abraços azuis!

Loana Teixeira


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